sábado, 19 de janeiro de 2008

Deambulacoes pelo Cambodja

(comentario "pre-leitura de post": para compensar os muitos dias sem actualizar o blog, venho por este meio dar inicio a um post bastante extenso. Em caso de se tornar aborrecido, ha sempre a opcao de saltar os textos e dar uma olhadela as imagens!)

As vezes parece que os momentos em que se vive mais intensamente sao os mais dificeis de descrever. A tendencia e recorrer a adjectivos que embora possuam uma carga altamente positiva, nao tem qualquer capacidade descritiva.
Passo a exemplificar:
- Entao que tal foram os ultimos 10 dias?
- Ahh... Incrivel! Foi demais, mesmo... Diverti-me imenso!
- Mas o que e que aconteceu exactamente?

(e agora e que comeca a parte dificil...)

Depois de introduzir a Catarina (a compatriota recem-chegada a Bangkok) as maravilhas do mundo das massagens e ao apetitoso consumismo desenfreado que se vive em Khao San Road (a "rua dos turistas" de Bangkok, onde se pode comprar todo o tipo de bens materiais - sobretudo roupa!!) pusemo-nos a caminho de uma das varias ilhas paradisiacas da Tailandia - Kho Chang. Foram dois dias de mergulhos intensos em aguas mornas que se tornaram cansativos porque, nos intervalos, ambas nos vimos obrigadas a ensinar civilizados holandeses e finlandeses a jogar futebol a boa maneira portuguesa (ou seja, com muitas caneladas e empurroes a mistura).
Descobrimos que, gracas a um jogo do Euro 2004, ha muito rancor entre os holandeses em relacao a seleccao portuguesa. A minha memoria de especime feminino nao me permitiu armazenar quaisquer pormenores desse jogo, mas parece que o facto da vitoria portuguesa ter ocorrido na sequencia de 4 cartoes vermelhos e 11 amarelos deixou muitos holandeses amargurados!

Terminados os 2 dias de relax, eu, a Catarina e o nosso companheiro holandes, o Rens, resolvemos por-nos a caminho do Cambodja, em busca do mitico complexo de templos de Angkor Wat. A travessia que no mapa parecia mais longa eram os quilometros pelo asfalto da Tailandia ate a fronteira - percurso esse que de facto demorou 7 horas. O que nao faziamos ideia era que, para percorrer os cerca de 150km da fronteira em Aranyaprathet ate a cidade de Siem Reap, iamos demorar umas 10 horas...

Primeiro as confusoes que trazem reminiscencias do caos indiano: o autocarro leva-nos para a "loja do amigo", um local onde podemos trocar os Bahts tailandeses e os Dolares por Riels (moeda cambodjana) a precos que nos deixam os cabelinhos em pe! Depois de enchermos os bolsos ao "amigo do cambio" la nos pomos novamente a caminho. Eis que 5 minutos depois o autocarro volta a parar. Avariado!! Mais uma hora e tal a espera que chegue um novo autocarro...
Mudanca efectuada e la retomamos caminho a uns alucinantes 30 km/h, enquanto percorremos uma estrada de terra batida bem esburacada.
E foi no meio desta confusa sequencia de paragens que conhecemos dois noruegueses, a Tonya e o Glenn, que ficaram depois no mesmo hotel que nos e acabaram por se tornar os nossos companheiros de aventuras pelo Cambodja.
Novamente a questao: como transmitir, de forma verosimil e minimamente comica, toda a sequencia de piadas sem sentido que deram azo a tantos ataques de riso enquanto exploravamos o Angkor Wat?? Nem sequer vou tentar, passo antes as apresentacoes:


Rens, the Dutch Fisherman
(o pescador holandes)


Glenn, the Norwegian Monkey
(o macaco noruegues)


Eu & Tonie & Catarina: The 3 weird chicks
(Sorry Tonie, but I had to post this foto!)


The whole gang: Catarina, eu, Tonya, Glenn e Rens

Nos e o nosso condutor de Tuc Tuc - o Tai
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Afinal o que e o Angkor Wat? E um dos muitos templos (e o principal, alias) construidos entre o seculo IX e o seculo XI, durante os tempos aureos do Imperio Khmer, um vasto imperio que se estendia nao so pelo Cambodja, como tambem por territorios que sao hoje em dia parte da Tailandia ou do Laos.
Depois da queda do Imperio Khmer (algures pelo seculo XIV - se a memoria nao esta a pregar uma partida), os templos acabaram por ficar ao abandono, semi-destruidos nao so pela mao humana como tambem pela propria natureza. Em finais do seculo XIX, os franceses (pela mao de um aventureiro explorador que deu pelo nome de Henri Mouhot) redescobriram Angkor Wat para o mundo que, recentemente, elegeu este templo como uma das sete maravilhas do planeta Terra.
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Angkor Wat tem mesmo muito para ver. Por isso decidimos dedicar 3 dias a contemplacao de templos. Demasiados dias? Nao, nem pensar! E conseguimos ver quase tudo gracas ao Tai, o nosso Tuc Tuc driver, que nos foi conduzindo de monumento em monumento. Havia quem optasse pelas bicicletas mas teria sido dificil ver tudo desse modo. Primeiro porque o calor era tanto que as vezes se tornava dificil manter os olhos abertos e o corpo em movimento. Depois porque havia templos muitos distantes uns dos outros, as vezes so 3 ou 4 quilometros, mas outras vezes a distancia rondava entre os 15 e os 20 quilometros.
Valeu a pena o esforco e os muitos dolares gastos??
Sem duvida! Ha templos impressionantes, quase nos conseguem transportar no tempo, para outras realidades que nunca conhecemos mas que, talvez gracas aos muitos filmes Hollywoodescos, conseguimos facilmente recriar na nossa imaginacao.
E claro, a sensacao de aventura! Porque ao atravessar certos locais eu senti-me uma exploradora, uma especie de Indiana Jones versao feminina. Ate chapeu arranjei, so faltava mesmo o chicote!
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O templo de Angkor Wat ao nascer do sol

A neblina matinal perto de um edificio (uma antiga biblioteca) pertencente ao Angkor Wat
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Uma das principais atraccoes consiste em apreciar o Angkor Wat ao nascer do sol. Toca a levantar da cama as 5h da manha para maravilhar os olhos semi-adormecidos com esta visao!
De facto valeu a pena, foi um momento bonito mas... com um pequeno senao. Houve momentos em que a magia de Angkor Wat e outros templos quase se esfumava, tornavam-se edificios banais. E porque?? Porque havia demasiados turistas como nos, a deambularem em grandes grupos barulhentos (malditos japoneses que estao por todo o lado!!), em busca da fotografia-perfeita. E quais as alturas mais confusas? Precisamente aquelas em que mais fazia falta o silencio, a completa ausencia de som, para serem devidamente apreciadas: o nascer e o por do sol.
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Um exemplo da multidao que se deslocava de madrugada a Angkor Wat
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Exploradores em Angkor Thom (ou seria Thom Bayom?? Ja nao sei, eram tantos...)
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Tonie e "Catarina versao romena com lenco na cabeca" em mais um templo cujo nome ja nao me recordo...
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E assim se passaram 3 dias em Siem Reap, a brincar aos arquelogos por Angkor Wat.
Terminada a exploracao de templos, partimos em direccao a capital do Cambodja - Phnom Penh. Desta vez, ainda meio traumatizados com a ultima experiencia via autocarro, resolvemos ir pelo rio. La foram 5 horas sem paragens, nem saltos em estradas esburacadas. Foi uma bela surpresa!
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O Cambodja e um pais com uma historia recente bastante sangrenta. Os dois principais "monumentos" (se e que se podem chamar assim) que retratam esses anos encontram-se precisamente em Phom Penh: sao os Killing Fields (ou campos de exterminio) e o Museu Tuol Sleng (antiga prisao da epoca dos Khmers vermelhos). Foram duas visitas bastante violentas, saimos de la como se tivessemos regressado de um campo de batalha, depois de termos avistado os muitos milhares de cadaveres espalhados pelo chao...
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O que aconteceu entao? Nos anos 70, a guerra do Vietname acabou por se estender aos paises vizinhos e muitos dos comunistas que andavam em fuga procuravam abrigo neste pais e no Laos. Claro que os Estados Unidos tinham que retaliar e, por isso, bombardearam e atacaram de muitas formas o Cambodja. Mesmo assim, o rei Sihanouk recusou-se a abrir o pais aos americanos. E isso nao pode ser, quem e que se atreve a afrontar o grande imperio americano??? Ai, ai,ai!! Obvio que a CIA teve que se apressar a dar uma licao ao rei: toca de arranjar o candidato perfeito, dar azo a um golpe de estado e XARAAAAN... O Cambodja encontrava-se livre do ditatorial regime monarquico e tornava-se finalmente um regime democratico!
E foi assim que o general Lon Nol chegou ao poder.
Entretanto, os comunistas refugiados pelo pais resolveram organizar-se como deve ser, e
comecaram a ganhar popularidade enquanto Khmers Vermelhos. O seu poder tornou-se mais forte com o apoio do rei Sihanouk e com o fornecimento de armas e afins por parte da China comunista. Em 1975, os Khmers Vermelhos chegaram ao poder e durante os 4 anos que estiveram no poder foram eliminados, das formas mais horripilentes, cerca de 2 milhoes de Cambodjanos (um terco da populacao do pais) e alguns jornalistas ocidentais.
O objectivo (segundo um dos nossos guias) era estupidificar a populacao, de modo a nao haver alminha que se atrevesse a questionar o regime. Dai que os primeiros a ser exterminados tinham que ser os mais "habituados a pensar". Uma das formas de determinar quem merecia sobreviver requeria a proximidade de palmeiras ou coqueiros: quem conseguisse subir ao topo da arvore era considerado "util", por isso sobrevivia. Quem nao conseguisse era um "inutil", nao merecia viver.
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Os Killing Fields - esta e uma "estupa" em honra dos que aqui foram mortos
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Esta imagem nao parece nada de muito impressionante mas a verdade e que la dentro se encontram varias prateleiras com milhares de caveiras que foram encontradas neste campo de exterminio.
Uma das atrocidades cometidas pelos Khmers Vermelhos, que ainda hoje causam sofrimento aos que estao vivos, foi a forma como eles sepultavam os mortos. Eles separavam a cabeca do resto do corpo e enterravam-nos em locais diferentes. Isto e extremamente agressivo para a cultura Khmer (os cambodjanos dizem-se Khmers - apesar da conotacao negativa da palavra, gracas a versao comunista: Khmers Vermelhos), porque eles acreditam que o espirito de um morto so consegue descansar em paz quando e sepultado devidamente, com todas as partes do corpo no mesmo local. Caso contrario, o espirito continuara a rondar o sitio onde morreu, em sofrimento.
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Bem... E todos estes dias passados em conjunto teriam que chegar ao fim...
No dia 16, a Catarina apanhou o seu voo para Bangkok e depois Portugal. O grupo ficou reduzido a 4 elementos. Para tentar enganar a nostalgia que ja se fazia sentir, resolvemos optar por programa mais animado e fomos dar uns mergulhos no Parque Aquatico de Phnom Penh!
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O minha primeira incursao num parque aquatico!! YUHUU!!
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Nos os 4 com o fiel guarda do parque (que se sentou junto as nossas malas e nunca as largou de vista) e a sua bela girlfriend
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E no dia 18 foi a despedida... A Tonya e o Glenn seguiram caminho para o Vietname, o Rens foi apanhar o seu voo em direccao a Bangkok e depois Australia.
E fiquei eu, meia atordoada pelas ultimas noites mal dormidas, pronta para seguir viagem "on my own" pelo Cambodja. Foi apanhar autocarro, seguir 3 horas de viagem e la estava eu numa nova cidade: Kampang Cham.
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E que tal viajar sozinha?? Ainda nao percebi se gosto ou nao... Ha momentos de euforia, em que sou invadida por uma sensacao de liberdade que so me da vontade de voar! Mas tambem ha momentos em chego ao quarto e nao ha ninguem, nao ha som (eu sabia que devia ter comprado umas colunas para o MP3!!), e uma especie de solidao parece que se apodera de mim.
A ver vamos! Amanha sigo para um local isolado algures no nordeste do Cambodja (chamado Sen Monorom), onde nao ha internet. Quando de la sair volto a partilhar impressoes desta viagem!

1 comentário:

Maria João disse...

Vais ver que o facto de estares sozinha vai ser uma experiência igualmente intensa! Espero que corra tudo bem! Beijinhos!